A viagem que não fiz e como aprendi meu país
Quando fui aos Estados Unidos, há anos, voltei me prometendo retorno para estudar de perto, e por um tempo razoável, aquela sociedade utilitarista, que era o império hegemônico e militar do mundo. Mas não tive o ensejo de voltar, mesmo com o passaporte valendo por dez anos. Já na época, como universitário da Faculdade de Direito (USP), tive possibilidade de ir, como convidado, logo após fundar o Partido Acadêmico Socialista, o único do movimento estudantil, e sem nenhuma ligação com qualquer agremiação exterior à escola. O certo é que não aproveitei um dos dois convites. A razão era a de preservar integra a posição nacionalista de defesa da soberania nacional. Um excesso quiçá! Com essa viagem – supunha — estaria exposta à maledicência da época, em razão daquele Programa do governo americano, identificado como Ponto 4. Ir e ser chamado no mínimo de inocente útil? Esse era o receio das críticas dos amigos que militavam na mesma corrente nacionalista. E mesmo não indo, como não fui, escrevia artigos sobre a necessidade dos outros viajarem, conhecerem, aprenderem com novas culturas.
Hoje, comparo esse rigor jovem, moço, de pensar e sonhar o Brasil, formador e conformador de minha atuação política pela vida afora – comparo-o – com governador de São Paulo, atual, usando ridiculamente o boné com o slogan da campanha de Trump: Make American Great Again. Junta-se a ele aquele bando de idiotas, que se contentara em ir e assistir, de lá mesmo e pela televisão a posse solene e pomposa. Boné político é como oferenda de carne fraca ou de entrega sem ônus, só para agradar cliente esfomeado. Esse gesto só tem simbologia um pouco menor, quando comparado com a continência, ato privativo de militares, feita pelo presidente inelegível, à bandeira estrangeira, quando flamulava somente ela, lá no seu país. Um servilismo inaceitável! Máxime de quem é militar!
Hoje, no outono da vida, testemunhamos o vento implacável da história engolindo todos e tudo, pessoas, instituições e impérios.
Quando começou a crise do império americano? Uns falam que as famílias perderam ou deixaram de vivenciar a força de princípios éticos e religiosos, que sustentavam o crescimento do poder, que seria hegemônico.
Outros recordam o discurso de despedida do Presidente Dwight D. Eisenhower (1890/1969), general comandante das Forças Aliadas durante a 2ª Guerra Mundial, cuja gestão cobriu o período presidencial, de 1953 a 1961. Naquele pronunciamento ele se referiu ao “complexo militar-industrial”, que o tempo compreendeu como o monstro insaciável, que se alimenta do sangue de rupturas e de guerras eternas. Em razão disso, a sociedade norte-americana se armou de tal sorte e maneira que hoje mais de 345 milhões de armas estão de posse da população. No interior dela há 15 milhões de veteranos de guerra, insatisfeitos e armados, e seu líder, em discurso recente se referiu aos multimilionários que circundavam Trump na sua posse, fazendo comparação da riqueza monumental deles com a situação social de fraqueza de 160 milhões de irmãos norte-americanos. É discurso de guerra civil anunciada?
No exterior, fez guerra à Coréia, entrou na Indochina, substituindo os franceses, invadiu o Afeganistão de onde saiu deixando armado os opositores com armas que totalizavam 80 bilhões de dólares, destruíram o Iraque, mas lá não ficaram por causa do petróleo, como pensavam que ficariam, destruíram a Libia. Na verdade, a resistência heroica e vitoriosa era de povos militarmente fracos.
Agora, um Presidente que mais parece um esqueleto sem alma, quer recuperar o poder de amedrontar, revogando regras, violando leis, falando grosso e muito, e até quer resolver conflito histórico construindo hotéis e cassinos, sua especialidade, nas terras ensanguentadas e resistentes de Gaza.
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Só que agora o mundo não é mais unipolar.
A estupidez não prevalecerá.