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A ética molenga do Brasil

A democracia brasileira, antes da brutalidade expansiva do dia de 8 de janeiro, no evoluir de seu processo de construção, que é sempre inacabada, dizíamos que ela era incipiente. E, por mais resistência das Instituições aos ataques diretos e indiretos que sofria, sofre e sofrerá, a verdade é que seu interior, e vagarosamente, ela está corroída, por uma ética molenga, que quando não disfarça, encobre e muitas vezes blinda quem deva ser punido, pelo ato pedagógico do exemplo.

O “jeitinho” brasileiro é o filho bastado da ética bastarda que é a ética molenga. Aqui, nesse espaço gigantesco de território e riqueza vigora o sequestro da riqueza material e do ato que demonstra amor devotado ao ilícito.

Com a maior desfaçatez nosso Poder Legislativo, tomado por um conservantismo de bitola estreita, fortalecido pelas fabulosas emendas parlamentares, pratica uma chantagem permanente, para dificultar a ação do governo.

As Forças Armadas, cientes de sua queda de prestígio perante a opinião pública, declara a dificuldade legal que tem para punir quem deva ser punido como militar. Um exemplo, é o militar expulso, partisse da “gang” do poder, e sua mulher recebendo todos os direitos da remuneração. No entanto, assiste à exibição do fardado silencioso, mas falsário, na Comissão Parlamentar de Inquérito, sem dizer que não pode usar a farda, pois sua simbologia não corresponde nem se iguala e mistura com atos de patifaria. A ideia lançada para recuperar o prestígio é instituir a Associação dos Amigos dos Militares. Tal entidade, diante da grave ocorrência de janeiro às portas dos quartéis, sob a benevolência suspeita, significa na prática colocar para dentro dos quartéis o que ficara de fora, inclusive e depois com xingamentos da massa abrutalhada e violenta. É preciso ato de determinação, de transparência favorável a democracia e as urnas, porque a armadilha, governamental e militar contra elas, foi estonteantemente desventrada e exposta à vergonha pública. Não pode se dirigir ao povo com comunicados duvidosos, como se o dever da Instituição não fosse claro, como se a exigência de dignidade da conduta militar não fosse determinante e obrigatória. Esse modo duvidoso tem sido o mantra militar, mesmo em relação aos generais envoltos com a corrupção deslavada e com a traição de seu juramento. Prestígio e credibilidade só emergem dos atos que correspondam à decência do juramento com os sinais externos da profissão, como a farda. No entanto, permita-se a repetição: sempre a palavra de dúvida, da acomodação e de advertência despropositada à cidadania, em tom de ameaça subliminar, numa clara sujeição à ética molenga.


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O Supremo Tribunal Federal admite que Magistrado julgue ação na qual seu filho, ou pai, ou mulher, integre e supostamente trabalhe no escritório que patrocina tal ação. Abre-se, até a possibilidade para incluir-se só o nome do parente, onde possa ser lido para angariar cliente. Mas a imparcialidade é adversária da ética molenga. A imparcialidade exige, por si, um esforço quase heroico do Magistrado para que esse ato seja projetado com transparência absoluta. Agora mesmo, os larápios togados de Curitiba, que furtaram a dignidade do Poder Judiciário e do Ministério Público, por abusos reiterados e crimes, ainda não responderam por seus delitos, e a opinião publica que recebeu a notícia de que dois bilhões de Reais estariam desaparecidos, ficou indignada, mas sem saber o que realmente aconteceu. O que se tem de prático é que o Juiz Appio, que começou a colocar o bisturi no câncer encoberto, aberto por Sérgio Moro, foi transferido da Vara sem que a motivação fosse real, e a independência do Magistrado tem a garantia constitucional da inamovibilidade, ou seja, não pode ser transferido, salvo por vontade própria, ou em decorrência de processo em que seja garantido a ampla defesa.  Não, tudo indica que essa garantia constitucional ganhou o prémio da ética molenga, e estabeleceu um precedente de facilidade perigosa. Difícil não ver nisso uma penalidade aplicada em quem age dignamente, sem o devido processo legal.

Um Magistrado de primeira instância absolvera a Presidente Dilma, que foi objeto de impeachment. O Tribunal Regional Federal confirmou a sentença absolutória, que significa não ter existido “pedaladas fiscais” como crime. E nos lembremos de que o Supremo Tribunal Federal não julgou o óbvio do golpe, que viria. E naturalmente causou um frisson na Câmara dos Deputados, já que um parlamentar entende que se deve fazer uma devolução simbólica do mandato a Dilma. Mas esse ato seria um desprestigio para o Congresso Nacional, só que é esse ato coletivo que dá a medida exata da enganação nacional, que levou honestos e desonestos e aproveitadores a embarcarem, por motivo subalterno, na barca furada da violação constitucional. Está claro que a ética molenga aceita qualquer situação para deixar seu dono ou com dinheiro ou com autoridade, ou em posição próxima de onde circula dinheiro grande.

Nossa imprensa não se desculpa da enganação que divulgou, sem que tenha investigado a versão dos larápios de Curitiba, com toda devastação que causou no mundo jurídico e político. Tão descuidado ela é que, no dia seguinte, a redução do preço da gasolina, ela entrevistava gerentes de postos do Brasil inteiro, para saber se já estavam praticando os novos preços, ignorando o natural estoque comprado na vigência dos preços antigos. Ou quando fala nas telas que o Lula “viaja muito”, sem demonstrar os motivos relevantes para o Brasil, e sem comparar com a mediocridade ostensiva do ex-Presidente, que colocou o país no isolamento internacional e no ridículo de sua atuação pessoal.

Essa ética molenga que emerge invadindo corações e consciências, só não pode causar um cansaço desesperançado do país.

Os praticantes da ética molenga ficarão no fosso da história, como nossa certeza no futuro do país.

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