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SABESP, o avanço do atraso

POR FERES SABINO | Não é porque vitorioso, como governador, mediante o prodígio político de descer de paraquedas, que ele pode ficar imune às críticas. Nem pode ficar blindado só porque já se exibiu num tanque de guerra, para simbolizar fidelidade ao absurdo encarnado. A propósito, não foi essa arma que “amedrontou” a maioria da Assembleia Legislativa, para ela concordar em excluir a “guerra democrática”, que seria aquele debate livre, decente e público, para privatizar a SABESP, lucrativa empresa de economia mista paulista. Agora, sob ataque da mentalidade neoliberal, que desossa o Estado, corta benefícios sociais, adota isenção desenfreada de impostos e destrói qualquer colegiado, que se qualifique como espaço de emergência de políticas públicas. Ele prometeu vender (não disse objetivamente por que), na campanha eleitoral, e pronto, ele só pode estar cumprindo compromisso com quem claramente não pode revelar.

Essa mentalidade do enfraquecimento do Estado, até um propalado Estado mínimo que nunca existiu, não se vexa em já ter quem declarasse que venderia todo patrimônio público, pagaria “parte da dívida”, não esclarecendo que sem receita adequada e com financiamento raquítico o único jeito é socorrer-se do financiamento das bancas da agiotagem nacional e internacional. Só para lembrar o oposto, o Japão se desenvolveu com financiamento próprio.

Para tentar convencer a opinião pública, já que em relação aos deputados eles ficam por conta das emendas parlamentares e os favores concedidos ou prometidos, largou-se fartamente o argumento da falácia, que ventilou a segura redução das taxas de águas como resultado a privatização. No entanto, logo após a aprovação da lei, que estaria contra a Constituição do Estado, a mesma verborragia corrigiu-se, cinicamente, dizendo que haverá redução, “mas não tanto”. “menor do que o estimado”.  Sabe-se, todavia, que com a privatização de qualquer serviço público transfere-se o patrimônio ao reinado do “lucro”, que não suporta redução. Sua natureza é da fome de querer sempre mais. “… “Para Lavinia Steinfort, coordenadora do projeto Alternativas Públicas do TNI, frequentemente a re-municipalização é motivada por saltos nos preços após concessões privadas. Ela cita os exemplos de Paris, onde as tarifas de água aumentaram 174% entre a privatização, em 1985 e 2009; Berlim, onde subiram 24% entre 2003 e 2006; e Jacarta, capital da Indonésia, onde triplicaram entre 1997 e 2015, quando um processo judicial movido por cidadãos obteve uma primeira vitória judicial para anular contratos com o setor privado”… Ainda, ela diz que “Entre 2000 e 2023, houve 344 casos de “re-municipalização” de sistemas de água e esgoto mundo afora, a maioria na Europa, de acordo com levantamento do banco de dados Public Futures (futuros públicos; publicfutures.org), coordenado pelo Instituto Transnacional (TNI), na Holanda, e pela Universidade de Glasgow, na Escócia” (in Por que a privatização da SABESP coloca o Brasil na contramão de outros países? Da jornalista Julia Dias Carneiro, da BBC News Brasil)

O que impressiona nessa forma de alienação coletiva, afinal a água constitui direito fundamental da pessoa, é que tantos políticos ainda não se aperceberam que as mudanças climáticas têm provocado danos coletivos da maior gravidade, e somente o Estado poderá sincronizar seus setores e recursos para fazer frente ao estrago em vidas humanos, em prédios, na natureza, nos rios, com os ventos, e tudo o mais que pode acontecer. O exemplo está próximo e na carne, já que durante a pandemia o “divino mercado” se recolheu, para ficar na moita, descansando, até a desgraça acalmar ou passar.  Recentemente, os estragos dos ventos fortes e da chuvarada surpreenderam a Capital do Estado, comprometendo o fornecimento privatizado da energia elétrica. Tal ocorrência inusitada não foi suficiente para alertar os “políticos do dia”, que permaneceram na única vontade de se reelegerem, e só. Praticamente, no mesmo período, o premiado Plano Diretor da Capital foi alterado, para permitir que as construtoras exponham sua capacidade de construir até as alturas das torres gêmeas, ou mais, colocando o meio ambiente, como campo de devastação continuada e sem limite, atropelando a natureza que tem revelado sua fúria em tantas partes do mundo. Qual será a cidade do futuro? Ninguém sabe. Mas se sabe que não poderá continuar sendo governada pelo interesse do lucro, só.


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A SABESP, sob ataque do vírus neoliberal, que prega e divulga que o Estado não sabe administrar suas empresas, ocupa, como empresa de saneamento, o lugar de uma das maiores do mundo, com suas ações negociadas nas Bolsas de Valores de São Paulo e Nova York, desde 2002, estando presente em 375 municípios, com a população atendida de 28,4 milhões de pessoas. O seu lucro no ano passado ultrapassou os três bilhões de Reais.

Um patrimônio público oferecida à gana do lucro. Não se deram ao cuidado elementar de mapear a experiencia internacional.

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