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KAFKA CENTENÁRIO

Sérgio Roxo da Fonseca
Procurador de Justiça e professor universitário (aposentado).

Tais Costa Roxo da Fonseca
Advogada

O escritor FRANZ KAFKA nasceu em Praga, República Tcheka em 3,6.1883 e faleceu em Klosternebug, Áustria em 3.6.1924. O seu centenário completa-se agora. Era filho de família judia. Completou seu curso de direito em sua cidade natal.

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(Coincidentemente, nestes dias a nossa Orquestra Sinfônica apresentou a música descritiva ‘O Moldava”, de Smetana que não por acaso circunda a cidade Natal de Kafka).


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Kafka trabalhou no âmbito de seguros, com inclinação para a cobertura dos riscos resultantes da prestação de trabalho. O seu pai era comerciante com o qual manteve muitos conflitos. Foi atingido pela tuberculose, doença até então não dominada pela ciência médica. Antes de falecer solicitou a seu amigo Max Brod que queimasse todos os seus escritos, no que foi desobedecido.

Notabilizou-se por escrever extraordinários e breves textos, como, por exemplo, “A Metamorfose” e “O  Processo”. Exerceu grande influência na produção literária e filosófica dos nossos tempos. As duas obras mais conhecidas são, portanto, “A Metamorfose”  e “O Processo”, dois pequenos e grandes livros. O presente comentário refere-se ao “O Processo”.

Neste último pequeno livro, Kafka descreveu a extraordinária angustia sofrida por um homem que recebeu em sua casa policiais que lhe comunicaram que ele está sendo processado.

 Desde o primeiro episódio, que ainda ocorreu em sua casa, o acusado indagou aos policiais a razão do seu delito, ou seja, o que teria ele cometido de errado.

Os policiais esclareceram que é um absurdo ele pretender tomar conhecimento do fato imputado, acrescentando que se insistisse em sua teimosia, pior será o peso da Justiça.

Imediatamente o acusado saiu em busca de esclarecimentos e contratou um advogado que volta a dizer-lhe que parasse de indagar qual o sentido do processo se não maior seria o peso da sentença.

O pobre réu, no início da audiência, insistiu em perguntar ao juiz a razão pela qual estva sendo processado. Imediatamente o seu advogado o interrompeu e lhe ordenou que calasse a boca.

Vale a pena acrescentar que, nos países supostamente democráticos, o objeto do processo interessa em primeiro lugar às partes, colocando-se, portanto, em outro plano tanto o trabalho da defesa, como as atuações do Juiz e do Promotor de Justiça.

No Brasil, a novíssima Constituição de 1988, num dos seus primeiros artigos determina que ninguém poderá ter a sua liberdade atacada por qualquer autoridade salvo se houver autorização  de    lei e somente de uma lei. Portanto nenhuma  autoridade brasileira pode atingir a liberdade de uma pessoa, salvo se estiver  autorizada pela lei e somente pela lei. Mais ainda: tanto o réu, como o Juiz de Direito e o Promotor de Justiça estão sob e debaixo do discurso normativo imposto pela lei. Tal é a regra contida no art. 5º da Constituição Federal. Pelo menos enquanto estivermos sob um regime democrático.

Em 1964 tivemos a oportunidade de defender em Ribeirão Preto um estudante universitário acusado de distribuir panfletos defendendo o Supremo Tribunal Federal. O libelo atribuía a ele o cometimento de crime contra a segurança nacional. Enquanto foi processado foi mantido preso na cadeia local. Somente depois da tramitação do longo processo foi absolvido!

Em apertada síntese, ensina a doutrina que somente tem cabida a intervenção estatal nas seguintes hipóteses: a) se houver lei outorgando aquele poder à autoridade pública; b) que o réu seja identificado no polo do processo; c) que autoridade proceda formalmente no exercício de seu poder; d) que a sustentação do ato editado pela autoridade se coadune com o fato examinado; e) que não tenha havido desvio de poder atingindo uma finalidade  não indicada pela norma atributiva do poder.

Inspirado no breve e bravo livro de Kafka, na Europa há quem diga que no passado quem mandava era o rei (“rex est legis”), hoje é a lei quem ordena (“lex est rex”).

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