Brasília de ontem e de hoje
“Deste planalto central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro de altas decisões nacionais, lanço meu olhar sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino.” – Juscelino Kubitschek de Oliveira
A ideia da transferência da Capital do Brasil do Rio de Janeiro para o interior é atribuída ao Marquês de Pombal (Lisboa, 1699-Pombal, 1782), que em 1751 até contratou a elaboração da carta cartográfica de Goiás. Depois, essa mesma ideia foi defendida por José Bonifácio de Andrade e Silva (Santos, 1763-Niterói, 1838), cientista e político brasileiro, abolicionista, Patriarca da Independência, para quem era mesmo, por motivo de segurança, a necessidade dessa mudança. No entanto, foi a Constituição de 1891 que expressamente incorporou essa ideia. Apesar de providências subsequentes, sua realização esperou, no arquivo do tempo, a força de um sonhador decisivo, como Presidente, para inaugurá-la depois de 41 meses do início de sua construção, no dia 21 de abril de 1960, por Juscelino Kubitschek de Oliveira. Nasce Brasília.
Depois, com o golpe militar de 1964, Juscelino, tantas vezes humilhado pelos militares, que até anistiara logo no início de seu governo os revoltosos de Aragarças e Jacareacanga, como exemplo de tolerância política, foi proibido de visitar a capital. Ainda assim, ele conseguiu visitá-la, mas como carona de um caminhoneiro que o conduziu até lá.
Brasília, à época, como Distrito Federal, não tinha governador, assembleia legislativa, senador, tinha somente o cargo de Prefeito, que era nomeado pelo Presidente da República.
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Foi com a Constituição de 1988 que ganhou autonomia, e passou a ter governador, vice-governador, 24 deputados e senador, eleitos pelo voto direto.
O perfil constitucional do Distrito Federal, como nossa capital, é a sede da União, responsável pela soberania do território nacional, e que entra em questão depois do ataque terrorista de 8 de janeiro do ano corrente, quando as sedes dos três poderes foram invadidas e depredadas nas inusitadas cenas geradas por quatro anos de pregação do ódio armado ou desarmado.
O Distrito Federal, na equivocada criação da Constituição de 1988, símbolo do solidarismo político-social e cultural, atribui a ele, Distrito Federal, a mesma autonomia que concedeu aos municípios do Brasil, fazendo-os entes federativos.
Acontece que a ilustração gerada pela barbárie do dia 8 de janeiro trouxe à luz a contradição configurada pela situação da União e sua sede representativa ficarem sob a proteção do Governador e de sua Polícia Militar.
Brasília, reconhecida como Patrimônio da Humanidade, ofereceu ao mundo a prova do gênio e da arte brasileira, por sua arquitetura arrojada e seus espaços planejados. Era, como é, motivo de orgulho nacional, apesar das alterações em seu projeto, que militares o fizeram.
Brasília enlameou-se com os governantes que mancharam a sua história pela corrupção impune. No entanto, um deles foi literalmente cassado, mas imediatamente lançou em substituição a mulher. A democracia brasileira oferece abrigo generoso de seus cargos públicos às famílias inteiras. Há família que até identifica os seus pelos números 01, 02, 03, 04, exibindo a prole da sorte. Essa prole ainda sonha vincular mais parentes à festança das rachadinhas. Um orgulho eticamente canceroso!
Houve um governador que patrocinou o inchaço migratório da cercania de Brasília, promovendo a distribuição gratuita de um milhão de lotes, construindo a gratidão coletiva dos votos em suas disputas eleitorais.
Leonam Liziero, em artigo intitulado “A autonomia do DF é anomalia federativa e foi erro dos Constituintes”, defende a tese de que o retorno do Distrito Federal à sua eficaz situação de sede do governo central, com o poder de nomear o Prefeito com a aprovação do Senado Federal, retirando de cena governador, vice-governador e assembleia legislativa, pode ser feita por meio de emenda constitucional, “uma vez que a limitação material de proteção à forma federativa não pode ser usada como justificativa plausível para impedir uma reforma…”. O jogo constitucional poderia ser a fonte de uma economia gigantesca, um saudável corte de despesas.
Feres Sabino – advogado
Ribeirão Preto
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